Edifício Andrea e Praça Portugal são temas de trabalhos contemplados no Prêmio de Literatura Unifor

Em sua 8ª edição, a premiação contempla 21 escritores e promove a publicação de dois livros de contos com trabalhos inéditos. O livro sobre a Praça Portugal e o conto a respeito do Edifício Andrea foram os primeiros colocados no concurso.

A dinâmica da cidade inspira produções nas mais diversas linguagens, e com a escrita literária não é diferente. As escolhas dos autores Simone Pessoa, 57 anos, e Cançado Thomé, 39 anos, ambos contemplados com o primeiro lugar na 8ª edição do Prêmio de Literatura Unifor, nas categorias “Obra Inédita” e “Trabalhos Inéditos”, respectivamente, comprovam isso. Eles optaram por registrar fatos de uma Fortaleza em movimento e, com a premiação, em breve poderão disponibilizar seus contos publicados, ao lado de outros 19 autores também selecionados pelo concurso.

Enquanto Simone se ofereceu como escrivã de histórias da Praça Portugal, Cançado Thomé tentou depurar em memórias a tragédia do Edifício Andrea, que desabou na Capital cearense, em outubro de 2019, matando nove pessoas. Os dois personificaram os lugares retratados, conferindo a eles o papel de narradores.

“Um dia, enquanto rodeava a Praça, pus-me a me perguntar quantas situações pitorescas deviam ter acontecido ali, quantos personagens curiosos protagonizaram dramas na Praça Portugal e em seu entorno? Em seguida, imaginei, quantas histórias interessantes a Praça poderia nos contar, se ela pudesse falar?”, conta Simone Pessoa.”

Sobralense, a autora confessa que aquele ponto de Fortaleza sempre exerceu fascínio sobre ela e, neste livro “Batizada pelo Sol, Festejada pelo Vento: Contos de uma Praça Portugal”, ela optou por trazer recortes de vida inspirados na realidade, mas todos com “fortes tintas da ficção”. “A imaginação foi o traço preponderante desses contos”, pontua. O processo de escrita inicial durou quatro meses, e foi estimulado pela polêmica mais recente de extinção da Praça. Para o prêmio, ela tirou o projeto da gaveta e atualizou-o, perfazendo 104 páginas.

Cançado Thomé, por sua vez, é natural de Goiânia, mora na capital cearense há dez anos, mas considera Teresina sua cidade-natal. Ele trabalhou o conto “Andréa de Dionísio” pouco depois do incidente com o Edifício, acompanhando o desdobrar diário dos acontecimentos. “O conto tem um estilo mais pessoal, mais introvertido. Esta não é minha forma de escrita mais usual, mais fluida, então, escrever Andréa de Dionísio foi um desafio técnico e emocional”, admite.

Por exigência da premiação, o conto tem menos de cinco páginas e foi escrito em cerca de duas semanas. “À época que escrevi, eu estava fazendo um curso sobre contos na plataforma Carreira Literária. Um dos materiais estudados no curso foi ‘O ovo e a galinha’, da Clarice Lispector. Não digo que foi uma referência direta e explícita, mas certamente eu fui influenciado pela genialidade daquela obra”, acredita. Aliás, sobre este aspecto, a praça de Simone ama o português Fernando Pessoa e sabe de cor trechos de poemas do poeta luso que ela faz questão de citar em vários momentos de seu livro.

PREMIAÇÃO
Os vencedores da 8ª edição do Prêmio de Literatura Unifor, anunciada em novembro de 2019, tiveram seus trabalhos avaliados por uma Comissão Julgadora composta por docentes de Literatura em Língua Portuguesa. Idealizada pelo professor da Universidade de Fortaleza e colunista do caderno Verso, Batista de Lima, a premiação foi criada em 2006 com o intuito de estimular a produção literária no ambiente universitário. A solenidade presencial de anúncio dos premiados, que iria acontecer no último dia 23 de março, teve de ser cancelada devido à pandemia do coronavírus. Logo, o resultado foi disponibilizado online na última quinta-feira (2).

Nesta edição, Simone Pessoa conquistou a publicação de seu livro numa tiragem de 400 exemplares, além de passagens aéreas para São Paulo, onde visitará a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin. Já Cançado Thomé integra o time de 20 participantes que terão seus contos reunidos em uma coletânea impressa com tiragem de 20 exemplares para cada candidato. Mas, além disso, por ter sido o primeiro colocado no ranking elaborado pelo júri, também receberá passagens aéreas para conhecer a Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro.

Em nota, a Comissão destacou que “tendo em vista o período de isolamento social decorrente das ações de prevenção ao novo coronavírus, assim como a suspensão temporária das atividades da Universidade de Fortaleza, a entrega dos livros aos vencedores e o agendamento das viagens do prêmio serão realizados a partir de data ainda a ser definida e comunicada”.

Para Cançado Thomé, que já tem alguns trabalhos publicados, a exemplo de libretos para ballets, com peças montadas como “O Julgamento”, “Le Jardin des Merveilles” e “Mediadora de Deusas”, além de outros livros coletivos de contos, a exemplo de “Quase Nome” e “Pélagos – Contos do mar”, a premiação veio em boa hora. “É um incentivo para continuar estudando e aprimorando minha escrita”, afirma ele, que também publica na página Leitura Livre.

Simone, por sua vez, autora de livros como “Dissertação não é bicho-papão: desmitificando monografias, teses e escritos acadêmicos”, “O Pequeno Hércules e outras fábulas contemporâneas” e da coletânea de crônicas “Bolsa de Mulher e Metacrônica”, destaca que o prêmio é um marco importante em sua trajetória. “Sobretudo pela seriedade com que é realizado e capitaneado pelo professor e escritor Batista de Lima e o fato de ter abrangência nacional, o que naturalmente credencia maior qualificação ao Prêmio. Por outro lado, está sendo uma oportunidade maravilhosa de divulgar meu trabalho e fazer com que minha escrita encontre mais leitores”, observa.

PRÓXIMOS PASSOS
Tanto Cançado Thomé como Simone Pessoa traçam planos literários para o futuro. O primeiro está com dois romances em estágio de revisão, com intenção de publicar um deles em 2020 ou 2021. Além disso, pretende continuar disponibilizando produções mais curtas em plataformas livres.

“Os meios de publicação digital têm sido um grande canal para escritores independentes. Contar histórias é uma atividade que sempre existirá. Compreendendo que cada um pode ter um lugar, mesmo que pequeno, para alcançar um leitor, a literatura é uma atividade recompensadora (mesmo que nem sempre financeiramente)”, salienta.”

Já a sobralense, quer fazer o lançamento do livro contemplado pelo Prêmio de Literatura Unifor logo que passar o período de isolamento na pandemia, e, se possível, na própria Praça Portugal. Ela também aguarda a disponibilização de duas obras de literatura infantil que estão sendo ultimadas pela editora cearense Armazém da Cultura, e, por esses dias, estará lançando pela Amazon, o e-book “Uma menina em tempos de coronavírus”, uma historinha que contextualiza o momento em que estamos vivendo. “Esse também é destinado a crianças, mas que fará todo o sentido para adultos”, adianta.

Fonte: Diário do Nordeste em 03.04.2020