Capital de “Tiro Certeiro”: A Jornada Eficiente de Funding, por Robertta Mota
A captação de recursos financeiros é um dos aspectos mais desafiadores e críticos ao longo da trajetória de qualquer empresa, especialmente, das startups. A complexidade surge quando o empreendedor precisa decidir o momento ideal para a captação, o valor necessário, as fontes dos recursos e a utilização mais adequada dos mesmos.
A ideia por trás da jornada eficiente de funding é simples, mas poderosa: trata-se da otimização do processo de captação de recursos em cada estágio de desenvolvimento da empresa para garantir que a mesma não apenas sobreviva, mas também prospere.
O primeiro passo é um profundo autoconhecimento e senso de autocrítica. O empreendedor deve ter um entendimento claro de suas limitações e potencialidades, de seu plano de crescimento e expansão, delineado com objetivos de curto, médio e longo prazos. Este é o alicerce sobre o qual todas as outras decisões serão tomadas.
Na sequência, ele precisa avaliar quais são as prioridades da startup intrínsecas ao seu atual estágio de desenvolvimento, dimensionar a respectiva necessidade de capital que será capaz de atender a essas prioridades, identificar as fontes de recursos mais adequadas considerando onde serão utilizados e, finalmente, implementar uma estratégia de captação de recursos bem elaborada e no timing correto.
De forma abrangente, são 4 os principais estágios de desenvolvimento de uma startup:
1) ideação e desenvolvimento, 2) prova de conceito, 3) decolagem e 4) maturidade.
O estágio de “ideação e desenvolvimento” se caracteriza pela validação das hipóteses chave para a solução de um problema enfrentado pelo mercado, da comprovação da efetiva existência de mercado, da ideia do negócio e da viabilidade do produto. A empresa ainda está em fase de criação, o produto ainda é uma ideia e o empreendedor busca manter a sobrevivência da empresa centralizando o controle. Aqui, a necessidade de recursos é imediata para a pesquisa e desenvolvimento, produção em escala piloto, construção do MVP (Minimum Viable Product, ou Mínimo Produto Viável) / protótipo e esforços comerciais para validação inicial do mercado. Geralmente, neste estágio, a necessidade de capital é coberta por recursos próprios (bootstrapping), familiares, amigos, incubadoras, recursos de subvenção econômica ou programas públicos e, mais raramente, por investidores anjo.
Quando a ideia de negócio ou inovação se transforma no projeto de empresa que tenta acessar o mercado, a startup passa ao estágio de “prova de conceito”. Aqui, o objetivo principal do empreendedor é colocar o MVP / protótipo / produção piloto para rodar, descobrir quanto o mercado está disposto a pagar pela solução e começar a faturar. Aqui, ele precisa de recursos no curto prazo para capital de giro inicial, esforços comerciais ainda com foco na validação de mercado, melhorias no produto e para os ritos e atividades de apoio, tais como serviços administrativo financeiros, gerenciais, jurídicos, comerciais, especializados etc.
Os recursos financeiros, na maioria das vezes, são (e devem ser) oriundos dos clientes dispostos a pagar pela solução em estágio de validação, bem como de subvenção econômica, aceleradoras, venture builders ou corporate venture builders, investidores anjo, plataformas de equity crowdfunding, fundos de capital semente (seed capital) e, potencialmente, de grandes corporações (corporate venture capital). Um dos objetivos desta fase é ajudar o empreendedor a desenvolver um “plano de negócios” que permita captar os recursos necessários para ganhar porte, passar para o estágio de desenvolvimento seguinte e decolar.
Na “decolagem”, finalmente, a startup está no mercado, já tem vendas recorrentes e alguns clientes fiéis ao produto básico, quer expandir sua carteira de clientes e lançar novos produtos. Entretanto, no meio do caminho há um abismo, um abismo que separa uma boa ideia de um bom produto. Além do risco do produto não ser aceito pelos consumidores em escala maior, também há o risco relacionado à velocidade e intensidade com as quais isso poderá vir a acontecer.
Essas variáveis são responsáveis pela sobrevivência ou morte de uma empresa, assim como a necessidade de capital para o crescimento do negócio e o potencial retorno que este deve trazer para os seus sócios. Desta forma, a captação é um grande desafio a superar, pois a empresa precisa de recursos no médio e longo prazos para capital de giro, estratégias comerciais e marketing, aumento da produção / produtividade, pesquisa e desenvolvimento de novos produtos / subprodutos. Neste contexto, a empresa também precisa desenvolver inteligência financeira para captação de recursos mais adequados a cada uso, seja via subvenção econômica, captação de dívida (financiamento via fomento ou bancos comerciais), investimento estratégico de grande corporação (corporate venture capital), rodadas mais avançadas de investimento em série A, B e C com fundos de capital de risco (venture capital), captação de dívida projetada para startups que não têm acesso a empréstimos bancários (venture debt) etc. Nas economias mais desenvolvidas, uma rede de contatos e a existência de investidores anjo e investidores corporativos associados ao venture capital se mostra de grande relevância ao associar os financiamentos com instrumentos de apoio.
Quando chega à “maturidade”, a startup já tem uma carteira de clientes consolidada em seu mercado atual, quer expandir-se rápido em outros mercados e lançar produtos complementares que permitam extrair mais valor dos mercados atuais. Os negócios estão mais maduros e buscam crescimento, consolidação ou reestruturação. Com frequência, implica em pensar em novos modelos de negócio (ex.: licenciamento tecnológico, franquias etc.), à exceção de negócios puramente digitais. A empresa precisa de capital em perspectiva de médio prazo para comercial e marketing, expansão de equipes, capital de giro, aumento da produção (montar nova estrutura ou ampliar atual) e para pesquisa e desenvolvimento. Além das formas convencionais de financiamento via captação de dívida, a empresa pode buscar apoio em mecanismos mais sofisticados como os fundos de investimento de private equity, operações de M&A (Mergers and Acquisitions, ou Fusões e Aquisições), assim como através de IPO (Initial Public Offering, ou oferta pública inicial) na bolsa de valores e SPACs (Special Purpose Acquisition Companies), alternativa mais rápida ao IPO tradicional, onde uma empresa já listada adquire a startup.
Como é possível verificar, o que torna a jornada de funding “eficiente” é a capacidade da startup de alinhar suas necessidades de capital com as fontes de recursos mais adequadas em cada estágio de seu desenvolvimento, pois na medida em que a empresa se desenvolve, o negócio vai precisando de um tipo distinto de recurso, com necessidades e prioridades diferentes para aplicação. Isso não só otimiza o uso dos recursos, mas também minimiza os custos de capital e maximiza o valor para os acionistas.
Entretanto, há mais pedras neste caminho…
Por isso, na Parte II deste artigo, falarei sobre aspectos mais complexos que impactam fortemente no sucesso da jornada de funding, tais como governança, diversificação de fontes de recursos, adoção de tecnologias emergentes, relacionamento com investidores, estratégias de saída etc.
Por Robertta Mota
Gestora CVM | Co-founder e Diretora de Gestão da Alya Ventures | Especialista em VC e CVC | +20 Startups +R$70 milhões | Criadora da Mentoria Startup Série A