Hidrogênio de baixo carbono, financiamento já! Por Cibele Gaspar
A Comissão Especial de Transição Energética e Produção de Hidrogênio da Câmara Federal, presidida pelo competente Deputado Federal Arnaldo Jardim, publicou recentemente Relatório Preliminar de Projeto de Lei para o Marco Regulatório do Hidrogênio de Baixo Carbono, que recebeu contribuições de melhoria da Sociedade Civil e organizações até o último dia 24.10.23
O relatório propõe a construção de um arcabouço regulatório e jurídico consistente, transparente e alinhado com as melhores práticas, inclusive internacionais, trazendo a desejada segurança jurídica aos agentes produtivos da cadeia do hidrogênio de baixo carbono e seus derivados. Dentre as propostas, há a importante previsão de equalização dos preços do hidrogênio de baixo carbono, fundamental para a competitividade mundial do produto brasileiro. Contudo, percebe-se uma lacuna importante num quesito fundamental para as decisões de investimento dos empreendedores – o financiamento.
A coordenação regional do Instituto Nacional de Energia Limpa no Ceará, para relação com financiadores, trabalhou em conjunto com a equipe nacional do Instituto na formulação de proposta que pudesse fechar essa lacuna e apresentar uma solução viável para discussão e incorporação ao marco regulatório proposto.
O INEL – Instituto Nacional de Energia Limpa e Sustentável é um centro de inteligência para apoiar os esforços em prol das fontes de energia limpa e sustentável. Localizado em Brasília, que atua desde 2020 , promovendo a democratização do acesso à energia limpa e mais barata, a toda a sociedade.
A proposição encaminhada pelo INEL consiste em estabelecer uma previsão de recursos estáveis para financiamento necessário à implantação dos projetos que propiciarão a implantação de uma cadeia produtiva robusta e eficiente de produção de hidrogênio de baixo carbono e seus derivados, priorizando a redução das desigualdades regionais e mitigação dos riscos climáticos.
A proposta define percentuais do valor arrecadado pelo Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixo Carbono (PDHBC) , a partir das receitas oriundas do petróleo , proposto no relatório preliminar , alocando 70%(setenta) por cento para fins de equalização de preços e/ou subvenção econômica na comercialização e os demais 30%(trinta por cento) para fins de financiamento à cadeia produtiva do hidrogênio de baixo carbono, especificamente para as regiões do Brasil que apresentam maiores situações de desigualdade, para que os recursos alocados tenham o sentido de propiciar uma transição energética limpa, inclusiva e justa e sejam aplicados através dos Fundos Constitucionais de Financiamento já existentes.
Os países desenvolvidos se mobilizam para apoiar financeiramente as iniciativas que viabilizem a transição energética. Vale citar, em particular , programas como o INFRASTRUCTURE INVESTMENT AND JOBS ACT – IIJA e o Inflaction Reduction Act – IRA , dos Estados Unidos, que tem previsão de aplicação de recursos financeiros superiores a U$ 2,5 trilhões nos próximos oito anos, para viabilizar a infraestrutura necessária para a transição energética, implantação de hubs de hidrogênio em diversos estados , subvencionar o preço do hidrogênio e financiar os empreendimentos .
A União Europeia também se mobiliza com o seu GREEN DEAL, com volumes superiores a € 1 trilhão, entre financiamentos e subvenções, e com o Banco Europeu de Hidrogênio, com cerca de € 800 bilhões, demonstrando a firme decisão desses blocos em não só subvencionar os custos de produção, como também apoiar financeiramente o setor privado na implantação dos empreendimentos.
As mais diversas e renomadas consultorias mundiais colocam o Brasil como o país de maior potencial competitivo em termos de preços para o hidrogênio e seus derivados até 2030 e 2050. Contudo, da mesma forma reiteram que tais condições podem ser alteradas sensivelmente, a depender do volume de subsídios e intervenções realizadas pelos demais países, que podem alcançar competitividade semelhante à brasileira e mantê-la por tempo indefinido artificialmente.
Entendemos então fazer sentido promover as condições para que as vantagens comparativas brasileiras não sejam subjugadas por ações externas. Cremos que a subvenção dos preços é ação estratégica fundamental até o estabelecimento maduro da cadeia produtiva e complementá-la com disponibilização de recursos estáveis de financiamento tornará mais atrativo ainda desenvolver a atividade no Brasil.
Por essa razão, a proposta do Instituto Nacional de Energia Limpa – INEL prevê a destinação de , no mínimo, 30% (trinta por cento) dos recursos do PDHBC arrecadados anualmente para repasse aos Fundos Constitucionais de Financiamento do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, constituindo-se desta forma em fonte regular de recursos de tais fundos, destinados exclusivamente ao financiamento das atividades produtivas relacionadas à transição energética e ao hidrogênio de baixo carbono , sua cadeia produtiva e seus derivados.
A proposta cuida ainda de sugerir que os encargos financeiros a serem praticados nas operações de crédito realizadas pelas instituições financeiras operadoras dos fundos constitucionais fiquem limitados à remuneração pela Taxa Referencial (TR) , acrescida de spread a ser definido por cada Instituição Financeira, limitados a 3%(três) por cento ao ano, de forma a equalizar condições com o recém-criado programa BNDES Mais Inovação.
Definir um percentual mínimo de aplicação de recursos captados pelo Programa, oriundos principalmente das receitas da atividade fóssil, além de ser uma ação reconhecidamente justa em prol da transição energética, ao utilizar as receitas de quem emite CO2 para financiar quem mitiga os riscos climáticos, é uma ação importante para assegurar recursos relativamente estáveis para o volume de empreendimentos que se vislumbra para o Brasil.
As regiões sugeridas para aporte de recursos para financiamento ( Norte, Nordeste e Centro Oeste) são as regiões do país reconhecidamente mais desiguais, para as quais se faz necessário construir opções diferenciadas de financiamento , de forma que o desenvolvimento se espraie pelo País de uma forma mais rápida, justa e inclusiva.
Por: Cibele Gaspar
Mestra em Administração e Gestão Estratégica pela Universidade de Fortaleza-UNIFOR. Especialista em Gestão Financeira, Controladoria e Auditoria pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Especialista em Financiamentos Internacionais pelo Banco Mundial e Universidade de Brasília. Atualmente é coordenadora regional para o Estado do Ceará, para relações com financiadores, do Instituto Nacional de Energia Limpa – INEL e Diretora de Novos Projetos da Câmara Brasil Portugal no Ceará.