IA, IE e o risco de nos tornarmos menos humano; Por Aline Lima
Fui provocada por um excelente artigo do Valor Econômico e resolvi escrever.
O texto revela um dado que me atravessou: a inteligência artificial generativa — aquela que cria textos, imagens, códigos e até decisões com base em grandes volumes de dados — pode impactar até 31,3 milhões de empregos no Brasil. Isso representa quase um terço da nossa força de trabalho, com atividades que podem ser transformadas, automatizadas ou até extintas nos próximos anos.
Confesso: fico igualmente fascinada e assustada.
Estudo o tema, faço formações e — claro — uso (e muito!) IA no meu dia a dia. Sempre fui entusiasta da tecnologia. Meu primeiro “empreendimento”? Digitar trabalhos e cartões de visita num Compaq Desktop 386. Minha conta no Instagram é de 2010 (sim, eu estava lá desde o começo).
Naquela época, quem tinha acesso largava na frente. Mas o ritmo era outro — o delay da evolução acompanhava o tempo do meu 386. Hoje, o salto é quântico. E o tempo para processar tudo isso… praticamente nenhum.
O estudo mostra ainda que 5,5 milhões de empregos brasileiros estão em ocupações com alto risco de substituição pela IA generativa. E o mais irônico: quanto maior a qualificação, maior o impacto. A IA já substitui não só tarefas operacionais, mas também funções cognitivas e criativas.
O alerta está lançado
A IA deixa de ser uma ferramenta de nicho e passa a ser infraestrutura básica do trabalho. Mas, em meio a tanto investimento, inovação e algoritmos de última geração, quase nada se fala sobre as pessoas.
O que será feito com quem for substituído?
Quais os impactos emocionais, sociais e políticos dessa transição?
E isso me preocupa.
“Quanto mais a IA entra nas decisões, mais IE — inteligência emocional — deveria entrar nas lideranças”, disse um CEO que admiro, com formação de base em psicologia.
Mas não entra.
Como psicóloga de formação e alguém que acredita (de verdade) na potência transformadora da tecnologia, não posso ignorar o abismo entre eficiência e empatia, entre crescimento e coletividade.
Não adianta criar uma SAI (Superior Artificial Intelligence) se nos tornarmos uma SUE (Sub-humana Experiência).
A história mostra:
Sempre que avançamos demais num eixo — econômico, técnico ou digital — sem sustentar os outros — humano, social, emocional —, o tombo vem.
Às vezes em silêncio.
Às vezes em forma de colapso.
O que está à margem
Metade dos empregos que poderiam se beneficiar da IA está prejudicada pela desigualdade no acesso digital.
Ou seja: a transformação não será democrática se não houver investimento real em requalificação, conectividade e inclusão.
O futuro não será apenas tecnológico.
Ele será, antes de tudo, político, humano e coletivo.
Que a IA nos liberte tempo para sermos mais humanos — e não menos.
Que as lideranças deixem de olhar só para a margem de lucro — e passem a olhar também para a margem da sociedade.
Por Aline Lima
Psicóloga, pós-graduada em Psicopedagogia e Psicopatologia, com formação em coaching executivo. Especialista em Gestão de Negócios e Programa CEO e Programa COO pela FGV. É CEO (Libercard), liderando desenvolvimento de produtos, equipes e relações institucionais e Diretora da Câmara Jovem da CBPCE.