Cultura oceânica e desenvolvimento sustentável, por Rômulo Alexandre Soares
O país de onde eu vim é quase todo coberto por água e construiu a sua identidade associada ao mar, declamada por seu poeta maior que viu partirem da ocidental praia Lusitana, por mares nunca de antes navegados, gente que novos mundos ao mundo foi mostrando.
Costumo dizer que essa minha conexão, por assim dizer, ancestral e genética com o mar me trouxe ao Ceará, a terra de Jacaré e Chico da Matilde e que inscreveu em seu pavilhão o farol, a jangada e o verde mar.
Quando em 2018 recebi o convite para colaborar com os trabalhos sobre economia do mar no Ceará 2050, vi uma oportunidade única para reforçar ainda mais a ligação entre o Ceará e Portugal unidos pelo mesmo Atlântico. Dois anos antes, em 2016, já tinha feito uma ponte entre a Fiec e alguns dos atores que haviam consagrado naquele país a maturidade de um importante hypercluster de economia do mar.
Mas o “mar de oportunidades” cearenses associadas às suas vantagens locacionais para o comércio internacional – turismo, esportes náuticos, tráfego de dados globais e geração de energias renováveis – deve se compatibilizar com uma agenda que priorize o desenvolvimento sustentável de uma faixa costeira expressiva de 573 km repletas de dunas com importante função ambiental e cênica e mangues que pareiam com a floresta amazônica na singular capacidade de sequestrar grandes quantidades de carbono. A Década do Oceano – no singular mesmo – estabelecida pelas Nações Unidas e que prossegue até 2030 e visa reforçar também o ODS 14, deve repercutir no nosso dia-a-dia.
É vital cuidar desse espaço que representa quase 70% do território da terra, produz 70% do oxigênio que respiramos, abriga 80% das espécies animais e vegetais do planeta e é uma importante fonte de proteína para consumo humano. E a melhor forma de fazer isso ao redor do mundo é cuidar das cidades, responsáveis por cerca de 80% dos resíduos encontrados no Oceano.
No Brasil, é parar de despejar no mar quase 2 milhões de toneladas de resíduos, conforme divulgado pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). E no Ceará, é cuidar do Rio Ceará e do Rio Coco, incluídos pela theOceanCleanup.com na lista dos mil rios no mundo que mais despejam plásticos no Oceano. No Cumbuco, é consolidar a coleta seletiva, reforçar a agenda de educação ambiental que promove a voz e pertencimento comunitário e avançar na certificação Bandeira Azul ainda em 2022.
A proposta da Cultura Oceânica no Brasil, liderada pela Unesco Brasil, ministério de Ciência e Tecnologia e Inovações e Universidade Federal de São Paulo, e que integrou o país através da Aliança Brasileira pela Cultura Oceânica, é promover uma educação para o desenvolvimento sustentável que promova compreensão das relações mútuas, individuais e coletivas com o Oceano e que têm importância local.
A recente iniciativa de formação de Multiplicadores de Cultura Oceânica para formar educadores e gestores que atuem em defesa da ciência, cidadania e do desenvolvimento sustentável, preparando atividades locais alinhadas à Década do Oceano e Agenda 2030 é também um grande avanço. Será muito importante para reforçar nosso projeto de Praia Inteligente.
De Portugal, trago uma outra inspiração: o escolaazul.pt, um programa educativo público que tem como missão promover a Cultura Oceânica na comunidade escolar e criar gerações mais responsáveis e participativas.
Cultura oceânica é compreender a influência do Oceano sobre nós e a nossa influência no Oceano.
(artigo publicado no Jornal OPovo em 08/04/22.
Por Rômulo Alexandre Soares