Os efeitos da Covid-19 na obrigação de pagamento de rendas por parte dos inquilinos no arrendamento não habitacional, por Osório de Castro Advogados
A difícil posição do senhorio na evolução do regime extraordinário para as situações de mora no pagamento da renda
A Pandemia COVID-19 e a consequente imposição de confinamento e encerramento das instalações comerciais por parte da ordem pública despoletou um conjunto de medidas por parte do legislador português, com vista a tentar equilibrar os efeitos económicos negativos causados no comércio e serviços.
Neste pressuposto, foi determinado um regime excecional para as situações de mora no pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional, previsto e regulado na Lei n.º 4-C, de 06 de abril de 2020.
Sucede que este regime, apesar da sua curta vigência, sofreu várias alterações, que consecutivamente foram frustrando as expetativas dos senhorios no recebimento dos valores que lhe são devidos a título de rendas vencidas no período do estado de emergência e de calamidade.
Estão contemplados por este regime os arrendamentos afetos a estabelecimentos abertos ao público, destinados a atividades de comércio a retalho e de prestação de serviços que estiveram encerrados ou que tiveram as respetivas atividades suspensas por força das disposições legais destinadas à execução do estado de emergência e ainda os estabelecimentos de restauração e similares que estiveram encerrados ou que tenham mantido a atividade limitada à prática de take-away ou entrega no domicílio.
Assim, aos arrendatários cujos estabelecimentos, por imperativo legal, se encontravam sob tal contingência foi dada a possibilidade de diferir o pagamento das rendas devidas aos senhorios. Se inicialmente tal benefício estava circunscrito aos meses em que vigorou o estado de emergência e ao primeiro mês subsequente, permitindo ao arrendatário proceder ao pagamento das rendas vencidas nos 12 meses posteriores ao término desse período, em prestações mensais não inferiores a um duodécimo do montante total, pagas juntamente com a renda do mês em causa, logo em 29 de maio de 2020, se alargou tal previsão.
Assim, em 30 de maio de 2020, entrou em vigor a alteração que dispôs que o período de regularização da dívida pelos arrendatários que diferiram o pagamento das rendas vencidas, só teria início em 01 de setembro de 2020, ou após o término do mês subsequente àquele em que cessar tal impedimento se anterior a essa data. Isto, com as seguintes limitações, por um lado, o período de regularização da dívida não ultrapassar o mês de junho de 2021, e por outro, as rendas diferidas serem satisfeitas em prestações mensais não inferiores ao valor resultante do rateio do montante total em dívida pelo número de meses em que esta deva ser regularizada, pagas juntamente com a renda do mês em causa.
Nas vésperas de se alcançar o dia 01 de setembro, concretamente, em 21 de agosto de 2020, mais uma vez se diferiu no tempo o período de regularização de tais rendas, prevendo-se o seu início a 1 de janeiro de 2021 e prolongando-se o seu pagamento integral até 31 de dezembro de 2022, ou seja, foi aberta a possibilidade dos arrendatários procederem ao pagamento em falta em 24 prestações sucessivas, de valor correspondente ao resultante do rateio do montante total por 24, liquidadas juntamente com o mês em causa.
E, ainda com a agravante de permitir ainda o diferimento do pagamento das rendas vencidas nos três meses subsequentes àquele em que ocorra o levantamento da imposição do encerramento das suas instalações. Sucede que, a partir de 21 de agosto, e quanto às rendas que se vençam a partir de 01 de julho de 2020 até 31 de dezembro de 2020, ficou estabelecido que o arrendatário não habitacional que pretenda beneficiar deste regime extraordinário, deve comunicar a sua intenção ao senhorio por carta registada com aviso de receção, sendo que tal comunicação deve obedecer a determinados requisitos, sob pena de ineficácia.
É certo que, em benefício dos senhorios cujos arrendatários diferiram o pagamento das rendas nos termos ora apresentados, foi prevista a possibilidade de concessão de uma linha de crédito com custos reduzidos para suportar a diferença entre o valor da renda mensal devida e o valor resultante da aplicação ao rendimento mensal ou à faturação mensal do senhorio, de uma taxa de esforço máxima de 35%. Todavia, não pode deixar de se concluir que tal recurso, face às condições exigidas para seu acesso, poderá não abranger parte dos senhorios e mesmo abrangendo, não ser suficiente para este fazer face às responsabilidades por ele assumidas face ao seu rendimento.
Sendo também expectável que existam arrendatários que diferiram o pagamento das rendas vencidas no período de pandemia, sob aparente proteção legal, e que poderão ser surpreendidos com o facto de não terem cumprido com o dever de comunicação e proposta de acordo, condição necessária para beneficiar de tal regime, desde 21 de agosto de 2020.
Fonte Osório de Castro Advogados