Transição energética e a internacionalização da economia do Ceará, Por Rômulo Alexandre
Não há como falar de energia no Ceará sem lembrar de Virgílio Távora e sua saga no início dos anos 1960 para trazer a eletricidade de Paulo Afonso e ligar as máquinas do primeiro distrito industrial do estado. Entretanto, é um pouco antes da virada do milênio que se processa uma segunda importante revolução, desta vez, no governo de Tasso Jereissati, para fazer o Ceará produzir energia e, assim, articular um novo mecanismo de internacionalização da sua economia.
Eu já era advogado e testemunhei essa nova revolução. Eram da Coelce os três aerogeradores implantados na ponta do Mucuripe na segunda metade dos anos 1990, anunciando uma nova vantagem locacional do Ceará: os bons ventos. Poucos anos depois, o PROINFA, programa federal de incentivo às energias renováveis lançado na transição entre os governos de Fernando Henrique e Lula, atribuiria ao Ceará uma importante fração dos projetos eólicos contratados naquele período, devido à qualidade do vento no seu litoral. Começava ali uma jornada bem-sucedida ligada à geração de energia limpa. Não demoraria muito para uma segunda vantagem locacional ser revelada: a produção de energia por fonte solar.
As energias renováveis não trouxeram para o Ceará apenas a oportunidade de gerar eletricidade, mas de integrar o estado a uma rede de alcance global que abrange empresas líderes em outros mercados e que, fazendo negócios no estado, investem capital, geram empregos e produzem renda.
De fato, o Ceará não atraiu apenas empresas de geração de energia. Atraiu outros atores dessa cadeia produtiva, como fabricantes de pás eólicas, aerogeradores, softwares e outros serviços especializados.
O Ceará prossegue sua tentativa de aprimorar um cluster de energia que já nasceu global com a atuação de multinacionais europeias que já investiam na geração de energia eólica e viram no Ceará uma oportunidade de aumentar a escala de seus negócios num estado integrado a um país e mercado continentais.
É nesse contexto que o Ceara, há cerca de um ano, decidiu investir na proposta de se tornar o hub brasileiro do hidrogênio verde. Em dezembro de 2021, num trabalho realizado pela Mckinsey, o governo do Ceará foi o primeiro a reunir o ecossistema de energias renováveis para elaborar um roadmap que permitisse – ao estado que em 1997 implantou sua primeira usina eólica, em 2011 a sua primeira usina solar – produzir a primeira molécula de hidrogênio verde ainda em 2022.
Se hoje se fala de hidrogênio verde no Ceará como uma oportunidade associada à transição energética, é importante que se diga que nada disso teria sido possível sem essa jornada de quase 30 anos que pavimentou um ambiente e governança favoráveis à atração de novos investimentos para gerar energia limpa. Isso explica por que o Ceará está à frente de outros estados brasileiros e já tem acordos de investimentos com importantes players globais para produzir hidrogênio verde no Complexo Industrial e Portuário do Pecém.
A proposta de criação de um hub de hidrogênio verde no Pecém, trará uma nova etapa no processo de internacionalização e amadurecimento desse cluster de energia, especialmente a partir da atração de outros investimentos em logística e transporte de amônia para a Europa e associação da produção do hidrogênio verde à geração eólica no mar.
Por Rômulo Alexandre Soares