Privatização da transposição: Não sem consulta, artigo escrito por Rômulo Alexandre Soares, sócio e 3º vice-presidente da CBPCE
A questão oportuna ali é exatamente o mecanismo para ouvir a sociedade em projetos de significativo impacto, ou seja, a consulta popular. Não me deterei na forma, mas na característica que lhe empresta a essência, a intenção de escutar, colher contribuições e permitir a opção por projetos e empreendimentos públicos ou privados mais consistentes a partir do escrutínio público.
Certa vez no condado de Orange, Estados Unidos, tive o privilégio de acompanhar os debates públicos sobre a mudança proposta por um empreendedor imobiliário para o zoneamento de um bairro, admissível por lá, mas não sem previa consulta e deliberação da comunidade atingida e, também, acompanhar em Portugal a execução do orçamento de estado mediante consulta e decisão popular. Por aqui, participei como membro do Conselho Estadual de Meio ambiente – COEMA, advogado ou cidadão, de várias audiências públicas de projetos de significativo impacto.
fracassar na participação popular é um resultado frustrante que se percebe em muitas audiências públicas. É preciso comunicar para engajar. É isso que gera pertencimento e faz com que as pessoas cuidem do que é de todos.
É vital assegurar, em complemento ao sistema representativo, uma democracia participativa que dê voz ao cidadão. Em essência, as audiências e consultas públicas são instrumentos de diálogo em temas como meio ambiente, compras públicas, parcerias público-privadas e questões regulatórias. Todavia, atender aspectos formais e fracassar na participação popular é um resultado frustrante que se percebe em muitas audiências públicas. É preciso comunicar para engajar. É isso que gera pertencimento e faz com que as pessoas cuidem do que é de todos. Há algo grave quando uma obra que afetará a vida de milhares de pessoas é desconhecida da maioria dos que serão diretamente impactadas. É preciso mudar isso.
Neste sentido, é uma boa notícia a alteração aprovada no Ceará recentemente pelo COEMA, que passou a admitir audiências públicas semipresenciais em projetos de significativo impacto ambiental, conforme diretrizes estabelecidas na Resolução nº 5. Apesar das audiências públicas já serem previstas no processo de licenciamento ambiental desde 1996, a nova regra não somente permitiu o acesso remoto de pessoas sem suprimir uma experiência presencial mínima, como inovou solicitando que empreendedores utilizem os meios de comunicação que dispõem, inclusive redes sociais, para publicitar estudos sobre o meio físico, socioeconômico e biótico atingidos, atrair pessoas para as audiências públicas e permitir que se acompanhem os debates durante todas as fases do licenciamento ambiental.
Com isto, espera-se que o processo de oitiva pública facilite de fato a integração da vontade comunitária nos projetos aprovados e o acompanhamento dos impactos e das medidas compensatórias e mitigadoras implementadas pelo empreendedor.
A consulta popular é uma forma de assegurar o domínio social dos interesses públicos, uma vez que o público não é, essencialmente, estatal e se fragiliza quando é apartado da experiência comunitária e as pessoas são silenciadas.
Por: Rômulo Alexandre Soares, sócio do escritório Albuquerque Pinto Advogados